O Segredo Verde de Okumidori
O vento soprava com força incomum naquela manhã de fevereiro de 1974. Estava eu sentado no pequeno escritório da estação experimental de chá em Kagoshima, observando as gotas de chuva escorrerem pela janela como lágrimas de um gigante invisível. Havia algo de melancólico naquele dia, talvez porque fosse o aniversário de minha separação, ou talvez porque o rádio tocava uma canção antiga dos Beatles que me lembrava de algo que eu não conseguia definir exatamente.
Foi nesse exato momento que Takeda-san entrou apressado, seus óculos embaçados pela mudança brusca de temperatura.
"Encontramos algo extraordinário," disse ele, colocando sobre minha mesa uma pasta verde com a inscrição "Okumidori" em caracteres precisos.
Não imaginava que aquele momento aparentemente trivial mudaria o curso da história do chá japonês.
Okumidori. Um nome poético para uma variedade de chá que significava simplesmente "verde profundo". Naquele dossiê, números frios e metodologias científicas tentavam explicar o inexplicável: como uma pequena mutação genética transformara uma planta comum em algo extraordinário.
Por trás daqueles dados estava o trabalho de uma década. Cruzamentos meticulosos, seleções pacientes, observações diárias. A ciência em sua forma mais pura e, paradoxalmente, mais mística.
Três anos depois, em um pequeno apartamento em Tóquio, uma mulher de meia-idade chamada Midori (uma coincidência que sempre me intrigou) preparava uma xícara de chá para seu filho que retornava da universidade. Ela não sabia que aquelas folhas eram da variedade experimental Okumidori, recém-liberada para produção limitada. Não sabia que aquele chá tinha um perfil único de aminoácidos que produzia um umami excepcional, com notas doces que permaneciam na língua como uma lembrança boa de infância.
"Este chá é diferente," comentou seu filho, que estudava música e tinha um ouvido apurado para harmonias. "Tem algo de jazz nele."
Midori sorriu, sem entender exatamente o que ele queria dizer, mas compreendendo perfeitamente ao mesmo tempo.
Em 1988, quando Okumidori finalmente foi registrada oficialmente como cultivar, eu já não trabalhava mais na estação experimental. Havia me mudado para uma pequena casa nos arredores de Quioto, onde criava gatos e escrevia artigos sobre jardinagem para revistas que quase ninguém lia.
Certa tarde, recebi pelo correio uma pequena caixa. Dentro dela, uma lata de chá Okumidori e um bilhete de Takeda-san: "Lembra-se daquele dia chuvoso? O mundo agora bebe o que testemunhamos nascer."
Preparei o chá seguindo o ritual que havia aprendido com meu avô. A água a 70 graus precisos, os movimentos circulares do chasen de bambu, a espuma verde que se formava como nuvens em um céu paralelo.
Ao beber, fechei os olhos. Por um instante fugaz, tive a sensação de que podia ver todos os caminhos que não tomei em minha vida, todas as possibilidades que ficaram suspensas no ar como poeira iluminada pelo sol da tarde.
Hoje, Okumidori é a terceira variedade mais cultivada no Japão, depois de Yabukita e Saemidori. Os especialistas dizem que seu sabor é mais complexo, com notas que revelam a personalidade do solo onde cresceu. Dizem que é especialmente adequada para matcha premium, com seu verde intenso que parece brilhar sob certas luzes.
Mas o que ninguém menciona nos catálogos ou nas descrições técnicas é como uma planta pode carregar em si tantos significados invisíveis. Como um pequeno arbusto verde pode conectar pessoas que nunca se conhecerão, criar momentos de contemplação silenciosa em vidas agitadas, ser a ponte entre o passado e o futuro.
Em algum lugar do Japão, neste exato momento, alguém está bebendo uma xícara de matcha Okumidori sem saber sua história. Sem saber de Takeda-san e seus óculos embaçados, ou da chuva que caía naquele dia de fevereiro, ou da música dos Beatles que tocava no rádio.
E talvez seja melhor assim. Talvez o verdadeiro sabor do chá esteja naquilo que não sabemos sobre ele.
Ou talvez, como me disse certa vez um velho monge enquanto compartilhávamos uma xícara de matcha Okumidori: "No fundo de cada xícara há um labirinto. Alguns bebem apenas o chá. Outros descobrem o caminho."